Um dos principais compromissos assumidos pelo presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva (PT), a manutenção do Auxílio Brasil em R$ 600 será acompanhada de, ao menos, duas mudanças nas regras atuais. Assim como o antigo Bolsa Família, o benefício voltará a ser concedido mediante acompanhamento familiar – o que incluirá a checagem das carteiras de vacinação e de matrículas escolares no caso de crianças – e incremento de até R$ 300 se a família atendida tiver dois ou mais menores de seis anos de idade. Na transição, no entanto, a maior preocupação está relacionada à continuidade dos serviços.
“É fundamental reafirmar que buscaremos uma transição que priorize a preservação dos direitos da população e evite qualquer descontinuidade. Temos uma experiência muito positiva em 2002, na transição da gestão Fernando Henrique Cardoso, e esperamos que se dê nos mesmos moldes, pautada pelo interesse do povo”, afirmou Tereza Campello, ex-ministra de Desenvolvimento Social e Combate à Fome da gestão Dilma Rousseff (PT).
A primeira preocupação do governo eleito diz respeito ao valor. Isso porque a Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) enviada pelo governo Jair Bolsonaro ao Congresso prevê, a partir do ano que vem, o pagamento de R$ 405 e não dos atuais R$ 600.
Uma das responsáveis pela área social na campanha, Tereza disse que o “compromisso de primeira hora é garantir os R$ 600”. “Em uma segunda etapa, vamos garantir mais R$ 150 por filho de zero a 6 anos e, com isso, voltaremos a ter a composição familiar como critério para, em seguida, passarmos a ter mais equidade.”
A economista destaca que o Auxílio Brasil não faz distinção hoje entre um homem em situação de pobreza, que more só, e uma mãe com duas crianças de zero a 6 anos. “Ambos recebem o mesmo valor É injusto”, afirmou Tereza.
Segundo o deputado federal reeleito Alencar Santana (PT), a bancada petista na Câmara já começará a negociar as alterações necessárias no Orçamento da União para que o valor atual seja assegurado em lei. “Acho muito difícil que mesmo os deputados e partidos que estavam no entorno da candidatura de Jair Bolsonaro vão jogar contra essa política”, disse. A equipe de Lula também reivindicará espaço orçamentário para aumento real do salário mínimo. Estima-se que seriam necessários ao menos R$ 150 bilhões
Regras
Tereza Campello disse que o novo governo tem a intenção de resgatar as principais características do antigo Bolsa Família: atuação coordenada com o Suas (Sistema Único da Assistência Social); parceria e pactuação com municípios e Estados; retomada do acompanhamento das condicionalidades em educação, para garantir o direito à escola; e em saúde, com acompanhamento médico e vacinação. “Tudo isto foi desconstruído no governo Bolsonaro e será retomado, porque é um direito da população.”
Na virada do Bolsa Família para o Auxílio Brasil, as exigências relacionadas à escola e à vacinação das crianças, por exemplo, deixaram de ser fiscalizadas. Só em setembro, o Ministério da Cidadania informou ter retomado o procedimento, mas sob advertência.
Cadastro
Para Marcelo Garcia, ex-secretário nacional de Assistência Social no governo de Fernando Henrique Cardoso (PSDB), retomar a qualidade do cadastro único (CadÚnico) será um desafio para o futuro governo. “Hoje não há qualquer gestão do cadastro, que virou só um passe para receber o Auxilio Brasil”, disse. “Tem gente recebendo sem direito e gente dentro do recorte que parou de receber.”
Primeiro coordenador do CadÚnico, desenvolvido em 2001, Garcia disse que as reavaliações das regras e das necessidades de cada família só serão possíveis a partir desse trabalho de reorganização do cadastro. “O Auxílio Brasil não se preocupa com o acompanhamento familiar, como o Bolsa Família se preocupava. Então, haverá mudanças técnicas, além de fortalecimento do Cras (Centro de Referência de Assistência Social, um projeto federal) “
Para 2023, o governo Bolsonaro propôs mais cortes na rede de apoio assistencial. A verba destinada ao Suas na LDO em trâmite na Câmara é de R$ 48,3 milhões – 95% menor que os atuais R$ 919 milhões. Em 2019, a reserva destinada foi de R$ 2,5 bilhões.
Para Tereza Campello, o Cadastro Único “agonizou” por dois anos no governo Jair Bolsonaro, enquanto ganhou espaço o aplicativo do Auxílio Emergencial que, segundo ela, funcionou mal, causando humilhações à população mais vulnerável. “Quando o CadÚnico voltou a funcionar, no fim de 2021, houve filas enormes para o atendimento e muitos erros de cadastramento.”
A ex-ministra disse ainda que, no próximo governo Lula, o sistema voltará a ser uma porta de entrada para as famílias a partir de duas dimensões a serem trabalhadas. “A primeira será corrigir os erros para atender a população num processo de registro humanizado e profissional a ser coordenado pelo Suas, que conhece as famílias e pode garantir uma inclusão efetiva e articulada com os serviços socioassistenciais. A segunda dimensão será melhorar o cadastro, utilizando novas tecnologias de acesso compreensíveis à população”, afirmou. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.
Fonte: Estadão Conteúdo