Hospitais privados relatam dificuldade para a compra de insulina humana para pacientes diabéticos e muitos dizem só ter estoque para um mês, mostra um levantamento da Anahp (Associação Nacional de Hospitais Privados), divulgado na última quarta-feira (11).
A sondagem envolveu 53 hospitais associados da entidade, que reúne instituições como Albert Einstein, Sírio-Libanês, Oswaldo Cruz e AC Camargo, de São Paulo. A maioria (79%) afirma que está difícil a aquisição do medicamento.
Embora a maior parte deles (91%) conta com um estoque de insulina, quase metade (49%) indicou que o volume é suficiente para apenas um mês.
O levantamento também questionou “como você classifica o nível de dificuldade para aquisição do medicamento, sendo 1 normal e 5 muito difícil”. Dos hospitais entrevistados, 51% afirmaram estar sendo “muito difícil”. Não foi perguntado aos hospitais quais marcas ou fabricantes dessas insulinas.
Uma das doenças crônicas de maior impacto no sistema de saúde, o diabetes tem crescido no país e no mundo. Dados da pesquisa Vigitel, do Ministério da Saúde, mostram aumento de 65% em 15 anos na taxa de adultos brasileiros diabéticos em 2021, eram 9,1% neste grupo, contra 5,5% em 2006.
Em 2023, o Brasil passou por uma escassez de insulina no SUS (Sistema de Saúde Único), tendo que recorrer a contratações diretas e à abertura de licitação para insulinas análogas, como a produzida pela Biomm. No início deste ano, a farmacêutica Sanofi, produtora da insulina Lantus, notificou a Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) a respeito de um risco de desabastecimento do medicamento no país.
Em maio último, a multinacional farmacêutica Novo Nordisk divulgou uma nota em que alertou para a indisponibilidade no fornecimento de insulinas a partir de julho. Isso afetaria tanto o programa Farmácia Popular quanto as redes privadas de farmácias e envolve os medicamentos Novolin® R (insulina regular) e Novolin® N (insulina NPH, de ação prolongada), ambos com apresentação em frasco.
Em nota enviada à Folha de S.Paulo nesta quinta (12), a Novo Nordisk informa que, diante de um cenário global desafiador de aumento de demanda e intermitência dos insumos, desde o mês de julho a companhia tem tratado da indisponibilidade no fornecimento para os mercados público e privado desses medicamentos. A previsão é que isso perdure até o fim deste ano.
“É importante destacar que esta restrição não tem relação com qualquer problema de qualidade ou segurança do produto”, reforça a nota.
No caso do fornecimento para hospitais, a Novo Nordisk informa que tem analisado cada pedido de compra, buscando sempre que possível atender às demandas.
Sobre o fornecimento de insulinas para o SUS, a companhia diz que não há problemas e que todas as suas entregas programadas seguem sendo feitas normalmente (incluindo algumas antecipações), de acordo com os contratos e quantitativos acordados com o governo.
Nos últimos dois meses, pacientes de municípios paulistas, como Ribeirão Preto e Sorocaba, relataram falta de insulina em frascos em unidades de departamentos regionais de saúde.
Em nota, a Secretaria de Estado da Saúde de São Paulo informou que a aquisição de insulina para abastecimento da rede básica dos 645 municípios paulistas é de responsabilidade do Ministério da Saúde.
“A última remessa enviada pelo órgão federal, abaixo do volume solicitado, foi distribuída e tem estoque previsto para dispensação até o início do mês de outubro”, diz o comunicado.
Nos hospitais estaduais, diz a secretaria, a aquisição de insulina tem sido realizada sob demanda, com estoques abastecidos até o momento.
Procurado, o Ministério da Saúde informou que a insulina análoga de ação rápida e as insulinas NPH e regular, compradas e distribuídas pela pasta, estão com fornecimento regular no SUS. A programação e a dispensação ficam a cargo dos estados, municípios e do Distrito Federal.
Reforça ainda que as insulinas também são ofertadas pelo programa Farmácia Popular, que atua de forma complementar à assistência farmacêutica do SUS. “A pasta tem envidado esforços em manter seu compromisso de abastecer e entregar os quantitativos aprovados às Secretarias Estaduais de Saúde e Distrito Federal em sua integralidade.”
Também em nota, o Sindusfarma (Sindicato da Indústria de Produtos Farmacêuticos) informou que não recebeu nenhum relato sobre um possível risco de desabastecimento de insulina. “Apesar da retração mundial de oferta de insulina humana, temos empresas no Brasil produzindo localmente esse importante produto e com capacidade de abastecer o mercado brasileiro.”
Segundo Paulo Augusto Carvalho Miranda, presidente da Sbem (Sociedade Brasileira de Endocrinologia e Metabologia), há um movimento de mudança de perfil de algumas farmacêuticas que têm se voltado mais para a produção de insulinas em canetas, o que estaria afetando a oferta das insulinas em frascos.
Ao mesmo tempo, elas também vêm utilizando seus parques tecnológicos para outros medicamentos biológicos que não são as insulinas humanas.
A insulina humana tem duas formas, a insulina NPH, de duração periódica, e a insulina regular, que é a rápida. Essas duas formulações muito utilizadas pela população em geral e também em ambientes hospitalares.
“Temos uma preocupação a respeito disso. A gente vê necessidade de um olhar estratégico para garantir a ampliação da produção e o acesso aos medicamentos seja através da produção nacional seja através da importação.”
Segundo ele, de uma forma geral, o SUS está abastecido porque oferta, principalmente, insulinas humanas em caneta. “Todos os pregões foram atendidos, e o abastecimento foi feito.”
O receio, diz ele, é que com a eventual migração de pacientes diabéticos que antes retiravam suas insulinas humanas em frascos nas farmácias populares. “A gente pode ter uma migração de parte desse grupo de pessoas que não consegue mais pegar (nas farmácias populares). E isso pode impactar sobre a previsão de demanda do SUS.”
Fonte: Cidade Verde