Mesmo com dados alarmantes e a com a lei do feminicídio, em 2022 no Piauí 23 mulheres foram mortas vítimas do crime. A socióloga Marcela Castro faz um alerta para as mulheres que vivem relacionamentos cercados de controle pelo parceiro. Segundo ela, essa é uma forma de violência que muitas vezes pode ser vista como cuidado ou proteção.
Considerado o 5º país que mais mata mulheres, no Brasil o crime de feminicídio é considerado inafiançável, segundo o Mapa da Violência de 2015, organizado pela Faculdade Latino-Americana de Ciências Sociais (Flacso).
No entanto, segundo especialistas, a violência física resultante em feminicídio não é o único indício de um relacionamento abusivo. O ciclo da violência é normalmente formado por três etapas. A primeira é a tensão, em que a mulher é controlada no comportamento, é isolada, sofre ofensas verbais e humilhações.
Depois acontece a violência física, patrimonial, moral, sexual ou psicológica para então entrar na fase da “lua de mel”, em que o homem promete a mudança que nunca acontece, momento em que ciclo se renova.
“Infelizmente essa é uma realidade que se repete todos os dias, por isso todo cuidado é pouco. A própria mulher em situação de violência pode achar que é uma espécie de cuidado. Tudo começa de forma muito sutil. É uma violência fantasiada de cuidado ”, pontuou a socióloga Marcela Castro.
Casos no Piauí.
Há um ano, uma trabalhadora doméstica, identificada como Valdirene Torquato, 42 anos, foi morta com golpes de faca pelo ex-marido, Ezequiel Rodrigues. O caso ainda choca os familiares, que lembram do ocorrido com pesar e lamentações.
“Ela vivia um relacionamento conturbado. Não podia conviver com a família que o marido já ficava com ciúmes. Era uma pessoa alegre e nos fazia rir. Ainda hoje sinto o vazio da falta que ela faz”, relatou um dos irmãos da vítima, o motorista Valdir Eugênio.
Outro irmão da vítima, o funcionário público Janielson Eugênio, conta que todos pediam para ela tomar cuidado com o relacionamento e que quando Valdirene teve coragem de sair da relação, o marido não aceitou.
“Depois que se separaram, ele entrou na casa dela e levou tudo. Minha irmã não imaginava que ele faria isso com ela. Depois de tanto tempo, ainda é muito difícil para gente lembrar desse caso”, relembra.
Mais um caso recente foi o da jovem agredida a pedradas pelo ex-namorado e logo em seguida atropelada por ele. A coordenadora do grupo de feminicídios do Departamento de Homicídio de Proteção à Pessoa, delegada Nathalia Figueredo, afirma que esse tipo de violência é progressiva e normalmente evolui, daí a importância da denúncia logo no início.
“Quando não acontece a denúncia por parte da vítima ou de qualquer pessoa que conhece o fato, fica mais difícil identificar o criminoso. Por isso temos o Disk 180, um canal relacionado à violência doméstica e familiar, o Disk Direitos Humanos (Disk 100) e o aplicativo do Salve Maria”, disse.
Mulheres protegidas.
Leis que resguardam e protegem as mulheres contra esse tipo de violência e relações abusivas são destacadas pela presidente da Comissão de Apoio à Vítima de Violência da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB-PI), Michele Amorim. Ela defende que o primeiro passo de combate é a denúncia.
“A lei Maria da Penha se destaca no Brasil, pois além de proteger ela é educativa e ensina as mulheres os tipos de violência e como o ciclo acontece. A sociedade e principalmente as mulheres precisam aprender e conhecer essas leis. Não podemos silenciar agressores e casos como esses”, afirmou.
Ela apontou ainda que existem formas de violência contra a mulher de maneira online. “A cultura do cancelamento, os ‘stalkers’ [perseguidores] e a vingança pornográfica são tipos de violência. Mas hoje em dia, existem diversas formas de provar o crime, como prints de WhatsApp, que podem ser validados e usados como provas, até relógios que marcam a frequência cardíaca”, pontuou.
Fonte – G1